quarta-feira, 19 de maio de 2010

5.



Portrait of a Man, Babalith


Mas nem a máquina nem a mulher estavam programadas para as palavras de Babalith, e não a ignoravam, porque nem mesmo a escutavam. «Ela é uma louca» pensavam, «genial, e não a escutamos, observamo-la da mesma forma que a um espectáculo capaz de nos distrair». E Babalith, como a mulher que investe carne contra aço, prosseguiu.
- “Esta cidade poderia contar uma história, que é uma história com muitas histórias. Uma vez, naquela altura, um adúltero invadia a varanda que, daquela altura, se encontrava com o contrabando existente junto aos arcos dos pórticos que, naquela altura, podia observar o pulo de um esquilo no muro que separa o Homem da ribalta. Mas da mesma forma que o Homem morreu e as torres perderam as varandas, as janelas, e assim aquela altura, também a cidade não conta nenhuma história e guarda apenas alguns sulcos do que terá sido, pelas poucas mossas e imperfeições impossíveis de apagar. Da História só ficaram objectos, máquinas e edifícios, e estes objectos, estas máquinas e estes edifícios perderam os seus traços característicos do tempo do Homem, e a seguir do tempo ainda da Mulher. Pois agora escutai as palavras que o sapo me ordena:
- “Vós, que apenas a um ruído de obsoleta informação vos haveis educado, um dia fostes mais selectos. E haveis dito: criámos a cultura. Quando criastes uma máquina. E haveis dito: eis a arte. Quando concluído outro mecanismo. E ainda: a política. A filosofia. E importante: A infelicidade. Antes a cultura era morta, e alimentava-se do esforço dos homens, hoje ganhou inteligência e é independente, e os homens podem-se sentar observando o espectáculo. Este foi o ócio dos homens. A arte estava inanimada, hoje a arte cria-se a si própria e encontrou a perfeição económica dos algoritmos. E foi assim que começou com a arte. A política, a filosofia dos bois de carga, e no estágio mais perfeito, a infelicidade, que fora sempre o objecto dos dramas. Este foi o legado do homem para a mulher, e ele chamava-se máquina. E observando esqueceu o homem o desejo e tornou-se ele mesmo máquina. Eis quando o homem se ultrapassou a si próprio. Nessa altura não houve mais escravos nem patrões nem deuses."


Desta, todos se riram e reconhecerem em Babalith, talentoso palhaço. Com estas palavras, então, embrenhou-se Babalith novamente nos bosques, abandonando a cidade.

Horned Wolf

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